O “corpo de dor” -
ECKHART TOLLE
No caso da maioria das pessoas, quase todos os pensamentos costumam ser
involuntários, automáticos e repetitivos. Não são mais do que uma espécie de
estática mental e não satisfazem nenhum propósito verdadeiro.
Num sentido estrito, não pensamos- o pensamento
acontece em nós.
“Eu penso” é uma afirmação simplesmente tão falsa
quanto “eu faço a digestão” ou “eu faço meu sangue circular”. A digestão
acontece, a circulação acontece, o pensamento acontece.
A voz na nossa cabeça tem vida própria. A maioria
de nós está à mercê dela; as pessoas vivem possuídas pelo pensamento, pela
mente. E, uma vez que a mente é condicionada pelo passado, então somos forçados
a reinterpretá-lo sem parar. O termo oriental para isso é carma.
O ego não é apenas a mente não observada, a voz na
cabeça que finge ser nós, mas também as emoções não observadas que constituem
as reações do corpo ao que essa voz diz.
A voz na cabeça conta ao corpo uma história em que
ele acredita e à qual reage. Essas reações são as emoções.
A voz do ego perturba continuamente o estado
natural de bem-estar do ser. Quase todo corpo humano se encontra sob grande
tensão e estresse, mas não porque esteja sendo ameaçado por algum fator
externo- a ameaça vem da mente.
O que é uma emoção negativa? É aquela que é tóxica
para o corpo e interfere no seu equilíbrio e funcionamento harmonioso.
Medo, ansiedade, raiva, ressentimento, tristeza,
rancor ou desgosto intenso, ciúme, inveja- tudo isso perturba o fluxo da
energia pelo corpo, afeta o coração, o sistema imunológico, a digestão, a
produção de hormônios, e assim por diante.
Até mesmo a medicina tradicional, que ainda sabe
muito pouco sobre como o ego funciona, está começando a reconhecer a ligação
entre os estados emocionais negativos e as doenças físicas.
Uma emoção que prejudica nosso corpo também
contamina as pessoas com quem temos contato e, indiretamente, por um processo
de reação em cadeia, um incontável número de indivíduos com quem nunca nos
encontramos.
Existe um termo genérico para todas as emoções
negativas: infelicidade.
Por causa da tendência humana de perpetuar emoções
antigas, quase todo mundo carrega no seu campo energético um acúmulo de antigas
dores emocionais, que chamamos de “corpo de dor”.
O “corpo de dor” não consegue digerir um pensamento
feliz. Ele só tem capacidade para consumir os pensamentos negativos porque
apenas esses são compatíveis com seu próprio campo de energia.
Não é que sejamos incapazes de deter o turbilhão de
pensamentos negativos- o mais provável é que nos falte vontade de interromper
seu curso.
Isso acontece porque, nesse ponto, o “corpo de dor”
está vivendo por nosso intermédio, fingindo ser nós. E, para ele, a dor é
prazer. Ele devora ansiosamente todos os pensamentos negativos.
Nos relacionamentos íntimos, os “corpos de dor”
costumam ser espertos o bastante para permanecer discretos até que as duas
pessoas comecem a viver juntas e, de preferência, assinem um contrato
comprometendo-se a ficar unidas pelo resto da vida.
Nós não nos casamos apenas com uma mulher ou com um
homem, também nos casamos com o “corpo de dor” dessa pessoa.
Pode ser um verdadeiro choque quando- talvez não
muito tempo depois de começarmos a viver sob o mesmo teto ou após a lua-de-mel
– vemos que nosso parceiro ou nossa parceira está exibindo uma personalidade
totalmente diferente. Sua voz se torna mais áspera ou aguda quando nos acusa,
nos culpa ou grita conosco, em geral por uma questão de menor importância.
A essa altura, podemos nos perguntar se essa é a
verdadeira face daquela pessoa – a que nunca tínhamos visto antes- e se
cometemos um grande erro quando a escolhemos como companheira. Na realidade,
essa não é sua face genuína, apenas o “corpo de dor” que assumiu
temporariamente o controle.
Seria difícil encontrar um parceiro ou uma parceira
que não carregasse um “corpo de dor”, no entanto seria sensato escolher alguém
que não tivesse um “corpo de dor” tão denso.
O começo da nossa libertação do “corpo de dor” está
primeiramente na compreensão de que o temos.
É nossa presença consciente que rompe a
identificação com o “corpo de dor”.
Quando não nos identificamos mais com ele, o “corpo
de dor” torna-se incapaz de controlar nossos pensamentos e, assim, não consegue
se renovar, pois deixa de se alimentar deles. Na maioria dos casos, ele não se
dissipa imediatamente.
Assim que desfazemos sua ligação com nosso
pensamento, ele começa a perder energia.
A energia que estava presa no “corpo de dor” muda
sua freqüência vibracional e é convertida em “presença” de beleza e alegria.