quarta-feira, 2 de março de 2011

HISTÓRIAS DE QUINTINO




A HISTÓRIA DE FALAICO O REI TIRANO
E SELENE A DEUSA LUA

Esta história nasceu de um sonho e o sonho nasceu de um trabalho terapêutico. Por isso, antes de contar a história de Falaico, o tirano e Selene, a deusa Lua, devo primeiro contar como a história nasceu.
Tendo eu recebido de minha terapeuta as tarefas de contar uma história no XIII Seminário de Sonhos (junho/2010) e de iniciar um trabalho sobre a questão do feminino e do masculino, nesta mesma semana, em uma única noite, lembrei-me de nove cenas de sonhos, dentre elas a que deu origem à história de Falaico e Selene.
A história veio no sonho praticamente como a relato, exceto os nomes dos personagens e o tom próprio de história, que eu elaborei, depois, ao escrever.
A forma como encontrei os nomes dos personagens constitui outra manifestação do processo terapêutico. Um dia após a noite do sonho, escrevi toda a história, mas faltavam os nomes, com os quais eu ainda não tinha atinado. Peguei um dicionário de mitologia que estava próximo de onde acabara de escrever a história, em busca de uma idéia. Não sei se abri o livro ou se ele abriu-se em minhas mãos. Fato é que estava aberto exatamente na letra F e o primeiro verbete que me saltou aos olhos foi FALAICO. O mesmo verbete me remeteu ao nome SELENE. Fato por mim entendido como sincronicidade.
De tudo isso que me aconteceu: tarefas-sonhos-história-sincronicidade-mitologia, eu só posso concluir que se trata de processo de cura.
Conto primeiro a história de Falaico e Selene do sonho e depois conto suas histórias mitológicas.
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Era uma vez um jovem rapaz que se chamava Falaico. Ele acabara de deixar para trás suas últimas brincadeiras de menino. Como uma cigarra que deixa sua velha pele presa em uma árvore e encontra-se pronta para as aventuras da nova fase: voar e cantar mundo afora, assim sentia-se Falaico. Alcançar a felicidade era sua meta.
Já no início de sua nova vida, eis que se apresenta uma grande e bela aventura: Selene. Uma jovem e bela moça, dona de encantos mil. O que encantava Falaico acima de tudo era o andar de Selene. A forma como deslocava-se no espaço, o ritmo de seus movimentos, o seu ir e vir. Aos seus olhos ela andava, flutuava e dançava, tudo ao mesmo tempo. Aquilo o deixava em estado de graça.
Mas ele não sabia como aproximar-se de tanta beleza. Consumia-se dia e noite, buscando uma maneira de demonstrar seu encantamento. Depois de muito tempo, muitas noites em claro, finalmente, ele deu com uma idéia. Levou para ela o mais lindo par de botas do mundo. Afinal o que mais o encantava era o andar de Selene. Nada mais significativo do que algo bonito e confortável para os pés de alguém que se deslocava com tanta leveza e graça.
Ao receber o presente Selene ficou muito feliz e sentiu que ali estava alguém com que ela poderia ir mundo afora. Alguém com tanta sensibilidade que percebera que seus pés mereciam carinho e cuidado. Eram eles, seus pés, que davam a ela o melhor dos sentimentos: liberdade. O que a tornava inteira, plena e verdadeira. Selene não perdeu tempo e calçou imediatamente as botas. Como se esperava, era como se tivessem sido feitas sob medida para seus pés. Selene ficou mais encantadora e bela. Não teve dúvidas de que Falaico era realmente a pessoa certa para acompanhá-la no ir e vir da vida.
Mas por força do “destino” Falaico não sabia nada sobre liberdade e beleza. A beleza o fascinava e ele só via um jeito de tê-la sempre diante de seus olhos: aprisionando-a. Quando buscou uma maneira de atrair a atenção de Selene, na verdade ele planejara uma armadilha para capturar aquilo que tanto o encantava. Quando a presenteou com as botas, sua verdadeira intenção era tornar-se “dono” de tal beleza. Tê-la para si. A estratégia que usou foi por cola no interior das botas. Uma vez calçadas, Selene não mais pôde removê-las de seus pés. Ao ver-se prisioneira de tal armadilha, Selene nunca pôde perdoar Falaico. Ela nunca mais sentiu-se inteira e plena. O que lhe dava esse sentimento fora-lhe roubado por alguém em quem ela depositara toda sua confiança. Sem liberdade, a beleza de seu existir mirrou e acabou-se. Tudo o que Selene pôde levar vida afora foi arrastar um par de botas que se tornaram grilhões em seus pés.

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As histórias mitológicas de Falaico e de Selene, segundo o dicionário, são de que Falaico era um rei grego que governava com muita tirania a cidade de Ambracia. Para livrar a população da cidade da violência do rei, Ártemis, deusa da caça, convidou o rei para caçar e concedeu a ele capturar um filhote de leão, que o rei levou para seu palácio. Pouco tempo depois uma leoa em busca do filhote estraçalhou o violento rei. A história de Selene é de que ela é a própria Lua, filha do deus Sol, que atravessa o céu em uma carruagem de prata puxada por dois cavalos completamente brancos. A beleza de Selene desperta a paixão de inúmeros amantes.
Há que observar mais algumas sincronicidades: o encanto do rei Falaico pela beleza do filhote de leão, a captura do mesmo e o fim trágico do rei, por tirar a liberdade do filhote. Tanto o jovem Falaico do sonho como o Falaico mitológico são fascinados pela beleza, mas não compreendem que ela só existe em companhia da liberdade. Outra é a admiração causada pela deusa Selene em seu movimento pelo céu, puxada pelo seu par de cavalos brancos e o andar de Selene do sonho com seu par de botas.

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Quintino S. Martins
13 de maio de 2010.

(Kury, M. da Gama. Dicionário de Mitologia Grega e Romana - J. Zahar Editor.)

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