A importância dos sonhos –
Carl G. Jung
Carl G.
Jung (org.)
O Homem e os seus Símbolos
O Homem e os seus Símbolos
Excertos adaptados
Ensaio sobre o inconsciente I
A importância dos sonhos
Aquilo a que chamamos símbolo é um termo, um nome ou mesmo uma imagem
que nos pode ser familiar na vida diária, embora possua conotações especiais
para além do seu significado evidente e convencional. Implica algo de vago,
desconhecido ou oculto para nós.
Assim, uma palavra ou uma imagem é simbólica quando implica alguma coisa
além do seu significado manifesto e imediato. Esta palavra ou esta imagem tem
um aspecto mais amplo, que nunca é definido de uma única forma ou explicado
totalmente, nem podemos ter esperanças de a definir ou explicar. Quando a mente
explora um símbolo, é conduzida em direcção a ideias que estão fora do alcance
da nossa razão.
Por existirem inúmeras coisas fora do alcance da compreensão humana é
que utilizamos frequentemente termos simbólicos como representação de conceitos
que não podemos definir ou compreender integralmente. Esta é uma das razões por
que todas as religiões empregam uma linguagem simbólica e se exprimem através
de imagens. Mas este uso consciente que fazemos dos símbolos é apenas um
aspecto de um facto psicológico de grande importância: o homem também produz
símbolos, inconsciente e espontaneamente, em forma de sonhos.
Há ainda certos acontecimentos de que não tomamos consciência.
Permanecem, por assim dizer, abaixo do limiar da consciência. Aconteceram, mas
foram absorvidos subliminarmente, sem o nosso conhecimento consciente. Só
podemos percebê-los em algum momento de intuição ou por um processo de intensa
reflexão que nos levem à subsequente compreensão de que devem ter acontecido.
E, apesar de termos ignorado originalmente a sua importância emocional e vital,
mais tarde brotam do inconsciente como uma espécie de segundo pensamento.
Este segundo pensamento pode aparecer, por exemplo, sob a forma de um
sonho. O aspecto inconsciente de um acontecimento é-nos revelado, geralmente,
através de sonhos, onde se manifesta, não como um pensamento racional, mas como
uma imagem simbólica. Do ponto de vista histórico, foi o estudo dos sonhos que
permitiu, inicialmente, aos psicólogos, a investigação do aspecto inconsciente
de ocorrências psíquicas conscientes.
Fundamentados nestas observações é que os psicólogos admitem a
existência de uma psique inconsciente, apesar de muitos cientistas e filósofos
lhe negarem existência. Argumentam ingenuamente que uma tal pressuposição
implica a existência de dois “sujeitos” ou, em linguagem comum, de duas
personalidades dentro do mesmo indivíduo. E estão inteiramente certos: é
exactamente isto o que ela implica. Esta divisão de personalidades é, com
efeito, uma das maldições do homem moderno. Não é, de forma alguma, um sintoma
patológico: é um facto normal, que pode ser observado em qualquer época e em
quaisquer lugares. O neurótico cuja mão direita não sabe o que faz a sua mão
esquerda não é caso único. Esta situação é um sintoma de inconsciência geral,
que é, inegavelmente, herança comum de toda a humanidade.
Aquele que nega a existência do inconsciente está, de facto, a admitir
que, hoje em dia, temos um conhecimento total da psique. É uma suposição
evidentemente tão falsa quanto a pretensão de que sabemos tudo a respeito do
universo físico. A nossa psique faz parte da natureza e o seu enigma é,
igualmente, sem limites. Assim, não podemos definir a psique nem a natureza.
Podemos, simplesmente, constatar o que acreditamos que elas sejam e descrever,
da melhor maneira possível, como funcionam. No entanto, fora das observações
acumuladas em pesquisas médicas, temos argumentos lógicos de bastante peso para
rejeitarmos afirmações como “não existe inconsciente”, etc. Aqueles que fazem
este tipo de declaração estão a expressar um velho misoneísmo – o medo do que é
novo e desconhecido.
Sigmund Freud foi o pioneiro, o primeiro cientista a tentar explorar
empiricamente o segundo plano inconsciente da consciência. Trabalhou baseado na
hipótese de que os sonhos não são produto do acaso, mas que estão associados a
pensamentos e problemas conscientes. Esta hipótese nada apresentava de
arbitrário.