terça-feira, 4 de maio de 2010

pag. 68


...Qualquer alusão ao que se passava dentro de mim era penosa, pois quanto mais lia e tomava consciência do mundo da cidade, mais crescia a impressão de que tal realidade pertencia a uma outra ordem de coisas, diferente da imagem do mundo que crescera comigo no campo, em meio a rios e florestas, entre animais e homens, num lugarejo adormecido à luz do sol, sob o céu onde passavam nuvens e o vento, ou envolvido por uma noite escura e misteriosa. Esse lugarejo não era apenas um ponto no mapa; era organizado e cheio de um sentido oculto, como o vasto mundo de Deus. Os homens, aparentemente, nada sabiam desse sentido, e os animais já o haviam esquecido.
Eu percebia isso no olhar triste das vacas, no olho resignado dos cavalos, na submissão dos cães, tão dependentes dos homens, e até mesmo na atitude segura do gato que escolhera a casa e a granja para sua morada e território de caça. Os homens também pareciam inconscientes como os animais: olhavam a terra sob seus pés e, em cima, as árvores, a fim de ver como poderiam utilizá-las e com que finalidade. À semelhança dos animais, reuniam-se em grupos, acasalavam-se e lutavam entre si, sem perceber que habitavam o cosmos, o universo de Deus, a eternidade na qual tudo nasce e tudo já está morto.

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