terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

trilhas e caminhadas


VENTANIA -ANTONIO PARREIRAS

DE TRILHAS E CAMINHADAS; DE PONTES E PEDRAS; ESCOLHAS.
Eliana Miranzi

Há um poema bastante conhecido, de autoria de Robert Frost, poeta norte-americano, onde ele fala de uma estrada. Nesta, havia uma bifurcação a certa altura. De um lado, o caminho era muito usado, pisoteado, gasto. Continha, e aí me deixo levar pela imaginação, os sinais de pegadas sobre pegadas. Sinais de vidas que por ali caminharam. Seres humanos que por ali trilharam rumo aos seus destinos.
Do outro lado, o outro caminho era bastante virgem, nu, cru, sem uso.
A relva crescia livremente, pois os passos humanos preferiam a trilha mais usada. Por que mais usada? Acredito que por ser mais fácil caminhar onde tantos outros já pisaram. Se tantos foram por ali, por que devo arriscar-me na estrada quase nunca usada?
Sem refletir, sem ponderar, faz-se a escolha. E vai-se pelo caminho mais fácil. No poema, o autor diz que não sabe por que, mas ao chegar àquele ponto, optou pela trilha menos viajada, menos pisada, menos usada. Fez sua escolha. Por que assim? Não sabe. Mas resolveu seguir na trilha menos conhecida. E essa escolha fez toda a diferença. Nossas escolhas determinam nossos destinos, nossa vida, o nosso futuro e o de muitos outros. E assim, posteriormente, temos que aceitar o que vier dali. Aproveitando o melhor, ultrapassando obstáculos, superando as dificuldades.
Uma estrada retrata bem o que representa uma vida. Ou melhor, imaginar-nos caminhando ilustra nosso caminhar pela vida.
Primeiro, há a escolha do caminho. Somos, a priori, colocados todos na estrada principal, naquela que nos conduz rápida e facilmente até a bifurcação. Aí, iniciamos nossa escolha. Talvez até mesmo antes, se “empacamos” no caminho principal, sem querer trilhá-lo por medo, insegurança, comodismo, ou seja lá qual for o motivo. Mas, se tocarmos em frente, chegaremos à bifurcação. De um lado, o caminho pisoteado, conhecido, gasto. De outro, o não usual, o novo o desconhecido. A escolha é nossa e devemos nos responsabilizar por ela.
Nossos passos imprimirão o testemunho de nossa caminhada, nossa existência, pelo chão. Seja no caminho mais usado, seja, e aí com mais nitidez, no caminho pouco ou nunca pisoteado, pois as marcas de nossos pés se imprimirão com mais força na relva virgem, ainda intacta.
Uma estrada sugere inúmeros encontros, incontáveis surpresas, quando desconhecida; ou naquela já propagada, encontraremos o que outros antes de nós já conheceram e fizeram-nos saber. Aceitamos ou não esse conhecimento.
Estamos a caminhar. Há uma curva. Beira um precipício. Este pode representar a profundidade de nossa alma, onde lá no fundo, estão guardadas nossas maiores riquezas. Portanto, o precipício não simboliza apenas algo ruim, perigoso. Pode simbolizar nossa descida interior, nosso encontro com solos mais férteis, onde moram nossas raízes profundas. Nossa ancestralidade. Nossa história, que nos diz de onde viemos e quem somos.
Continuemos; há pedras no caminho. Decidimos o que fazer com elas: saltá-las? removê-las?
Subidas e descidas e chegamos a um rio. Se optamos pela estrada conhecida, alguém antes de nós muito provavelmente já providenciou uma ponte. Estrutura de ferro e concreto, madeira, um tronco de árvore, não importa. Pontes unem, ligam, ajudam na travessia. Abaixo, correm as águas. Calmas, deslizantes, ou apressadas, agitadas, contendo fúria e perigo. Águas rasas, transparentes ou profundas, opacas, escuras. Cabe-nos o cuidado necessário ao cruzar pontes. Cabe-nos perder ou aproveitar a oportunidade de parar e observar as águas. Um rio tem sempre muito a ensinar. A cada um sua lição. É preciso saber escutar. Rios passam, correm, cantam, levam e trazem. Fazem aparecer e desaparecer. Saciam a sede. Matam e dão vida.
São modelos de mudanças constantes. Já disse alguém que é impossível atravessar o mesmo rio duas vezes. Rios são caminhos que nos levam ao mar, local das primeiras formas de vida.
Bem, agora uma nova subida. Um morro a transpor. Como vamos escalá-lo? De olhos baixos, preocupados com o que nossos pés pisarão, ou observando o que há e em torno. Nossa postura nos dará a chance ou não de percebermos se já atingimos o cume. Com os olhos da alma podemos parar e apreciar a paisagem. Ou, com os olhos voltados para as pedras e os espinhos do caminho, passaremos pelo cume, iniciaremos a descida, e tarde demais notaremos o que perdemos. (referência ao poema de Sara Teasdale, “The Long Hill”). O pico da montanha ficou para trás e não absorvemos toda a beleza, encantamento, magnitude que ele nos oferecia à vista e ao coração. Muito tarde percebemos que o que nos resta é só descida. Nossas escolhas são feitas. A cada passo deixamos algo para trás.
Depende de cada um de nós tirar proveito ou não da caminhada. Louvar o Criador pelas maravilhas encontradas ou lamentar incessantemente pelos obstáculos. Deixaremos nossa marca na trilha a fim de generosamente, melhorá-la, embelezá-la, deixá-la mais suave aos que a seguir virão?
Posso remover pedras, limpar a trilha, construir pontes, ou barreiras. Posso melhorar o que já existe, ou dificultar o caminho semeando espinhos, em lugar de flores.
Inspiro profundamente o ar do cume da montanha e só percebo e absorvo o perfume da natureza, ou apenas sinto o cheiro do ódio, a carniça da intolerância e incompreensão, o fedor da inveja e da ingratidão? Mais uma escolha...
O destino final da viagem só Deus conhece. É-nos reservada a surpresa. Posso chegar ao mais lindo vale, cheio de luz, harmonia conforto, e calor, ou posso chegar a um depósito de lixo.
A escolha de como vemos o mundo faz toda a diferença. Assim como faz toda a diferença o que deixaremos para os que, depois de nós vierem a percorrer a mesma trilha...(2007)

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